segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Horta Orgânica

Todo alimento orgânico é muito mais que um produto sem agrotóxicos. É o resultado de um sistema de produção agrícola que busca manejar de forma equilibrada o solo e demais recursos naturais (água, plantas, animais, insetos, etc.), conservando-os a longo prazo e mantendo a harmonia desses elementos entre si e com os seres humanos. Deste modo, para se obter um alimento verdadeiramente orgânico, é necessário administrar conhecimentos de diversas ciências (agronomia, ecologia, sociologia, economia, entre outras) para que o agricultor, através de um trabalho harmonizado com a natureza, possa ofertar ao consumidor alimentos que promovam não apenas a saúde deste último, mas também do planeta como um todo.

HORTA FAMILIAR OU ESCOLAR

Para implantação de uma horta orgânica em pequenas áreas pode-se considerar o calculo de 10 m2 por pessoa e que uma hora de trabalhos diários possibilita a manutenção até 100 m2 de área trabalhada.

Para início da produção é importante realizar um planejamento. Nele deve-se definir os espaços a serem utilizados e o tipo de produção pretendida. Descrevemos no item Instalação da horta, algumas instalações indispensáveis à implantação de uma horta orgânica.

O planejamento da produção se refere à escolha dos produtos pretendidos, verificando-se época de plantio, variedades adaptadas, escalonamento de produção, consórcios, ciclos das culturas, exigências e tratos culturais necessários, assuntos que trataremos mais adiante.

Em uma horta conduzida no sistema orgânico, e necessário inicialmente tomar conhecimento sobre dados regionais como clima, tipo de solo, proximidade com áreas florestadas, fauna existente, e outras. Todos estes fatores são relevantes para a condução de um plantio que deve interagir com o meio ambiente em que se insere.

O clima, por exemplo, é determinante na adaptação de certas culturas e deve ser levado em consideração na seleção de variedades. As diferenças entre estações, quanto a temperatura e pluviosidade devem ser verificados, servindo como base para um calendário de épocas de plantio.
O tipo de solo é o fator mais relevante a ser considerado para a produção. O solo deve ser encarado como um organismo vivo, que interage com a vegetação em todas as fases de seu ciclo de vida. Devem ser analisados os aspectos físico, químico e biológico dos solos.

O aspecto físico do solo se refere à sua textura e sua estrutura. A textura de um solo se relaciona ao tamanho dos grãos que o formam. Um solo possui diferentes quantidades de areia, argila, matéria orgânica, água, ar e minerais. A forma como estes componentes se organizam, representa a estrutura do solo. Um solo bem estruturado deve ser fofo e poroso permitindo a penetração da água e do ar, assim como de pequenos animais, e das raízes.

O aspecto químico se relaciona com os nutrientes que vão ser utilizados pelas plantas. Esses nutrientes, dissolvidos na água do solo (solução), penetram pelas raízes das plantas. No sistema orgânico de produção os nutrientes podem ser supridos através da adição de matéria orgânica e compostos vegetais.

O aspecto biológico trata dos organismos vivos existentes no solo, e que atuam nos aspectos físicos e químicos de um solo. A vida no solo só é possível onde há disponibilidade de ar, água e de nutrientes. Um solo com presença de organismos vivos indica boas condições de estrutura do solo. Os microorganismos do solo são os principais agentes de transformação química dos nutrientes, tornando-os disponíveis para absorção pelas raízes das plantas.

A matéria orgânica é um dos componentes de um solo e atua como agente de estruturação, possibilitando a existência de vida microbiana e fauna especifica, além de adicionar nutrientes à solução do solo.

Os solos no Brasil em geral são ácidos sendo recomendável, sempre, iniciar a correção do solo com a aplicação de calcário, de preferência o dolomítico que, além de conter cálcio, tem magnésio. O calcário deve ser aplicado dois meses antes do plantio.
No Brasil os solos também sofrem de deficiência de fósforo. De acordo com o resultado da amostra do solo é bom aplicar adubo fosfatado. As principais fontes de fósforo são farinha de ossos, hiperfosfato ou termofosfato.

Para esclarecer, existem dois tipos básicos de nutrientes:

Macronutrientes – Fósforo, potássio, nitrogênio, cálcio, magnésio e enxofre – estes são exigidos em maiores quantidades pelas plantas.

Micronutrientes – boro, cloro, cobre, cobalto, vanádio, sódio, ferro, manganês, molibdênio e zinco, são utilizados em quantidades ínfimas pelas plantas, mas possuem importância vital.

Alguns tipos de adubo orgânico fornecem nutrientes específicos, por exemplo, cinzas de madeira são ricas em potássio, cálcio e magnésio.

A proximidade com áreas florestadas é um fator que está relacionado ao equilíbrio ecológico regional de modo mais geral e, mais precisamente, à presença de espécies da fauna que podem interagir com o plantio. Aves e insetos são componentes da cadeia que vai ser gerada a partir de um plantio orgânico.

INSTALAÇÃO DE UMA HORTA

O local de instalação da horta deve ser de fácil acesso, maior insolação possível, água disponível em quantidade e próxima ao local. Não devem ser usados terrenos encharcados. O terreno pode ser plano, em áreas inclinadas os canteiros devem ser feitos acompanhando o nível, cortando as águas.

Os canteiros devem ser feitos na direção norte-sul, ou voltados para o norte para aproveitar melhor o sol.

No local da horta não é aconselhável a entrada de galinhas, cachorros, coelhos.

Dentro da horta deve haver uma pequena divisão de áreas para facilitar o manejo. Deve-se reservar uma área para sementeira; área de canteiro; área para guardar ferramentas e insumos; área para preparo ou armazenamento de composto ou húmus;

Recomenda-se que seja coletada uma amostra de solo e enviada para análise. O resultado de uma analise de solo representa as características do seu tipo de solo. Estes dados são a base para a recomendação correta de adubação, no presente caso adubação orgânica, necessária para obtenção de hortaliças saudáveis e resistentes.

A sementeira ocupa aproximadamente 1% da área da horta, deve ficar em local alto, seco e ensolarado. Pode também ser um canteiro comum, com cobertura contra sol e chuvas fortes.
A sementeira é usada para germinação das sementes de hortaliças que possam ser transplantadas. As sementes de hortaliças de modo geral são pequenas e exigem cuidados especiais como solo rico em nutrientes, peneirado, regas diárias, abundante mas não excessiva, sol indireto, profundidade correta de semeio.

Existem insumos prontos que facilitam o trato da sementeira, tais como substrato orgânico e bandejas de isopor para acondicionar as mudas com tamanhos e numero de células variáveis. As mudas podem ser produzidas em caixotes, em copos de café, ou ainda em um canteiro feito especialmente para este fim, de acordo com as condições descritas.

Os canteiros devem ser feitos com enxada, trabalhando-se a terra a uma profundidade de 40 a 50 cm. Este trabalho pode ser mecanizado. A profundidade da terra trabalhada tem relação com o desenvolvimento das raízes. Os canteiros podem ser simplesmente levantados em relação ao nível do solo, em 30 a 40 cm.

Os canteiros feitos com elevação do solo possuem drenagem natural, podem ser constantemente revirados, mas em solos arenosos não vão manter sua forma. Os canteiros podem também ser cercados por tijolos ou tabuas ou construídos em alvenaria. Ao construir canteiros é necessário estar atento para assegurar a drenagem deixando passagem para o excesso de água, o que inclui um dreno na parte inferior da parede do canteiro e uma camada de pedras, pequena a médias, recobrindo a totalidade do fundo. Canteiros construídos duram mais tempo.

As dimensões de um canteiro podem variar. A largura deve possibilitar o trabalho no canteiro de um só lado- onde alcance o braço- até 1 a 1,20 m.

O comprimento deve se adaptar à área disponível não devendo ultrapassar 10 metros, o que dificultaria a circulação entre os canteiros.

Entre canteiros devem ser deixadas ruas com 40 a 50 centímetros de largura para circulação. Caso se utilize carrinho de mão, deixar a largura necessária para a passagem.

Algumas ferramentas indispensáveis para uma horta são: carrinho de mão, enxada, enxadão, pá, ancinho, sacho, colher de muda, plantador, regador ou mangueira ou sistema de irrigação, tesoura de podar, barbante ou arame e pulverizadores.

Chama-se adubação orgânica o uso de material vegetal e animal utilizado como insumo na produção agrícola. A matéria orgânica, quando aplicada dentro das técnicas e sendo de boa qualidade é um dos principais agentes de estruturação dos solos. A aplicação de matéria orgânica no solo atua na estrutura do solo, na manutenção e desenvolvimento da vida microbiana do solo, no aporte de nutrientes. Um solo bem estruturado possui maior resistência à compactação e à erosão.

A adubação orgânica pode ser usada em forma de composto, húmus de minhoca, de esterco curtido, adubação verde com leguminosas ou outras. Ela é importante também para cobrir o solo em lugares muito quentes ou muito frios, protegendo as raízes e mantendo a umidade.

O uso de adubo orgânico nos plantios deve ser feito com material curtido. Uma terra desgastada deve receber, gradativamente, matéria orgânica suficiente para incentivar o retorno da fauna do solo.

A compostagem é uma técnica que facilita o manejo do esterco, reduz o volume de material, a perda de Nitrogênio e outros nutrientes após a aplicação; elimina sementes de ervas daninhas, insetos; conserva o esterco até que a aplicação seja necessária.

O nome composto vem da mistura de materiais usados em sua fabricação. Um composto bem feito possui matéria orgânica transformada em húmus e atua no solo como uma cola entre os pequenos pedaços de terra, melhorando sua estrutura e dá condições ao solo de armazenar maior quantidade de água, de ar, e de nutrientes, que alimentarão as plantas.

Caso não haja no local espaço suficiente para fazer uma composteira, você poderá adquirir o adubo orgânico já pronto para uso. Alguns exemplos: esterco de aves, farinha de ossos, torta de mamona, entre outros. Além disso, para permitir uma umidade ideal para seu solo, deve-se usar Vermiculita expandida, um excelente condicionador de solo.

O ideal é no primeiro ano usar 2 kg de composto por metro quadrado de canteiro. O canteiro poderá ser usado até três vezes num ano, repetindo-se o uso do composto em cada plantio.

Hortaliças são espécies vegetais cultivadas em pequenos espaços, em geral com ciclo curto de vida, exigentes em água e nutrientes. A reprodução das hortaliças pode ser através de sementes, brotos, ramas, bulbilhos.

Há sementes disponíveis no mercado de boa qualidade. Ao comprá-las é importante verificar os dados de validade, pureza e % de germinação. Como estas sementes são melhoradas geneticamente possuem características especificas como época de plantio e ciclo de colheita. Estas informações devem ser bem avaliadas. Por exemplo, há cenouras apropriadas para plantio de inverno e de verão.

As variedades devem ser escolhidas de acordo com as condições ambientais da área e plantio. Uma boa idéia é escolher duas variedades de uma hortaliça, plantá-las na mesma época e “pesquisar” sobre o desenvolvimento de cada uma delas. A escolha da melhor variedade está relacionada a: taxa de germinação, desenvolvimento da planta, resistência a ataque de pragas e doenças, produtividade, aspecto do produto final, sabor.

Em uma horta podem ser plantadas diferentes tipos de hortaliças. Como exemplo citamos alguns, agrupando-os pela parte comestível mais utilizada:

Raízes: Cenoura, rabanete, batata doce
Bulbos: alho, cebola, beterraba
Folhas: Alface, almeirão, chicória, couve, espinafre, repolho
Frutos: Berinjela, tomate, pepino, pimentão, jiló, quiabo, abóbora, feijão-vagem
Flores: Couve-flor, brócolis
Ervas: hortelã, manjericão, alecrim, mostarda, orégano, cebolinha, salsa, coentro

Existem bons calendários de plantio à disposição em livros de horticultura. Citaremos rapidamente um calendário de plantio:



É importante organizar o semeio de acordo com o que se pretende colher. Para isso devem-se analisar dados de cada cultura.

Por exemplo: alface tem ciclo que pode variar de 35 dias no verão a até 60 dias no inverno. Um canteiro com 5 metros de comprimento e 1,20 metros de largura resultam em 6 m2 de canteiro, o espaçamento da alface sendo de 25 x 25 cm, resulta em 96 plantas por canteiro. Se um canteiro for semeado em um único dia, haverá uma colheita de aproximadamente 96 pés em, no máximo, uma semana, uma vez que a alface tem ciclo curto e pode “passar” do ponto de colheita neste tempo.

Isto é diferente para outras culturas que podem permanecer bastante tempo no canteiro com a colheita estendendo-se por mais de um mês, como a couve, berinjela, cenoura, brócolis, jiló, cebolinha, salsa entre outras.

De acordo com o que se pretende colher, aconselha-se que sejam realizados plantios semanais de alface, chicória, ervilha, rúcula, rabanete.

Os tratos culturais necessários para a manutenção de uma horta serão descritos, e é necessário estar atento ao desenvolvimento de cada cultura no campo para se detectar o momento correto de serem aplicados.

Cuidados na sementeira – Na sementeira prepara-se a muda que vai para o campo. É uma época de muitos cuidados porque uma muda saudável gera um planta produtiva. Na sementeira a terra deve ser limpa de doenças e sementes de outras ervas para evitar doenças e competição; deve-se dar preferência a solos arenosos, onde a germinação das sementes é mais fácil e evita-se o encharcamento. A sementeira deve ser coberta para evitar a incidência direta de raios solares e chuva. A cobertura pode ser feita com palha, bambu, tela, plástico.

Transplantes – é a passagem da muda da sementeira para o canteiro e só pode ser realizada quando a planta já tem folhas definitivas e raiz desenvolvida. Não confundir as folhas definitivas com as primeiras folhas que surgem. A época de transplante varia para cada cultura, mas pode-se tomar como regra que a muda tenha entre 4 e 8 folhas definitivas.

Rega – A irrigação é responsável pelo aporte de água ao plantio. A água tem funções diversas como fornecer água para germinação da semente, desenvolvimento da planta, solubilizar os nutrientes do solo para disponibilizá-los para as plantas. Existem vários tipos de irrigação; em pequenas áreas recomenda-se o uso de mangueira, regador ou ainda sistema de irrigação por aspersão. Plantas de ciclo curto e pequeno porte são mais sensíveis à falta de água. A fase de sementeira exige regas diárias, sendo aconselhável que seja feita duas vezes ao dia. A irrigação deve ser realizada, sempre, nas horas mais frescas do dia. Uma forma de determinar a necessidade de rega é verificar qual a umidade do solo a uma profundidade media de 10 cm.

Rotação de culturas – ao planejar um canteiro, deve-se evitar o plantio sucessivo de uma mesma cultura, assim como plantas da mesma família. A rotação reduz a chance de aparecerem doenças e pragas e possibilita um melhor aproveitamento dos nutrientes disponíveis. Uma boa seqüência a ser utilizada é: folha, raiz, flor, fruto (exemplo: alface, cenoura, brócolis, berinjela). Este método possibilita ainda o plantio sem necessidade de refazer o canteiro, utilizando-se apenas adubação de plantio.

Cobertura morta – utilizada para proteger o solo contra a chuva e o sol. Nos solos argilosos evita formação de crostas duras na superfície. Em solos arenosos aumenta a retenção de água no solo. Também evita a presença de ervas invasoras. Pode ser feita com palha, capim cortado, casca de arroz ou outro material disponível. Não deve ser incorporado ao solo.

Controle de ervas – as ervas invasoras tem aspectos positivos e negativos para o desenvolvimento da cultura. São positivos a atração de insetos, a cobertura do solo, a produção de massa verde que pode ser usado na compostagem. São negativos a competição por água e nutrientes e insolação. As ervas devem ser controladas quando se verificar competição (exemplo, o mato está mais alto que a cultura plantada).
Adubação verde – consiste no plantio de leguminosas junto, ou antes, da cultura pretendida. A adubação verde melhora o solo, trazendo nutrientes de partes mais profundas, elimina nematódeos, cobre o solo com muita massa verde e incorpora ao solo o nitrogênio que as leguminosas captam do ar. Tipos de leguminosas mais usados: guandu, mucuna-preta, mucuna-anã, feijão de porco, puerária e leucena. Estas plantas podem ser usadas em rotação nos canteiros, associadas ao milho ou em terras em descanso. Podem ainda ser aproveitadas para alimentação animal, humana (guandu) e como lenha (guandu). Em solos compactados convém anteceder o plantio da horta com cultivo de leguminosas.

Desbaste – no plantio definitivo é necessário diminuir o número de plantas no canteiro possibilitando um maior desenvolvimento das plantas que ficam.

Amontoa – juntar terra no pé das plantas (para couve, brócolis, beterraba, rabanete e outras).

Estaqueamento - suporte para plantas trepadeiras; usado para ervilha, feijão vagem, tomate, pepino. Pode também utilizar a cerca da horta ou pés de milho já colhidos.

Controle de pragas – considera-se praga o ataque de inseto que cause danos sérios a plantação ou reduza a produção. Não há necessidade de controle enquanto não há dano. Os ataques podem ainda ser minimizados com a rotação de culturas, plantas bem nutridas, presença de inimigos naturais (joaninha, pássaros). O controle pode ser feito através de produtos como óleo de neem ou pó de fumo.

COLHEITA e ARMAZENAMENTO

A colheita é uma atividade que varia de acordo com a cultura. A colheita de frutos é feita quando estes estão maduros, de vez, ou dependendo do produto, ainda verdes. Folhas podem ser colhidas através da retirada total da planta ou de algumas folhas apenas.

Os melhores horários de colheita são os de temperatura mais baixa quando os vegetais perdem menos água, o ideal é antes do sol forte, para folhas; e no final da tarde para raízes.
Após a colheita as hortaliças continuam perdendo água o que pode levar ao murchamento ou desidratação do seu produto. Conservar os produtos em locais frescos mantendo-os úmidos é a melhor forma de conserva-los. Em locais frios ou geladeira os alimentos se conservam melhor.

Para melhor apresentação, conservação e higiene as verduras devem ser lavadas em água corrente e retirados todos os restos de terra, folhas secas, ou outras impurezas.
Controle Agroecológico de Pragas e Doenças

Manejo Integrado de Pragas (MIP) e os Métodos Agroecológicos

O que é melhor curar? A febre ou a doença que a provoca? Responder a essa pergunta significa optar pelo tratamento do efeito (a febre) ou da causa (doença) de um determinado problema. Assim como no corpo humano habita uma série de microorganismos que coexistem pacificamente conosco, na lavoura esses organismos também se encontram no solo, nas plantas e nos organismos dos animais. Só quando o corpo e a agricultura se tornam fracos e desequilibrados em seu metabolismo, é que esses organismos oportunistas atacam, tornando-se um problema. Isso significa que a origem do problema não é a existência desses organismos, mas o desequilíbrio presente ou no corpo humano ou no ambiente agrícola.

Na agricultura convencional, as práticas de campo se direcionam para o efeito do desequilíbrio ecológico existente. Este desequilíbrio gera a reprodução exagerada de insetos, fungos, ácaros e bactérias, que acabam se tornando "pragas e doenças" das lavouras e das criações de animais. Aplicam-se agrotóxicos nas culturas, injetam-se antibióticos e outros remédios nos animais buscando exterminar esses organismos. Contudo, o desequilíbrio quer seja no metabolismo de plantas e animais, quer seja na constituição físico-química e biológica do solo permanece. E permanecendo a causa, os efeitos (pragas e doenças) cedo ou tarde reaparecerão, exigindo maiores frequências de aplicação ou maiores doses de agrotóxicos num verdadeiro "círculo vicioso".
Na agricultura orgânica, por sua vez, trabalha-se no sentido de estabelecer o equilíbrio ecológico em todo o sistema. Parte-se da melhoria das condições do solo, que é a base da boa nutrição das plantas que, bem nutridas, não adoecerão com facilidade, podendo resistir melhor a algum ataque eventual de um organismo prejudicial. Cabe destacar o termo "eventual" porque num sistema equilibrado, não é comum a reprodução exagerada de organismos prejudiciais, visto que existem no ambiente inimigos naturais, que naturalmente irão controlar a população de pragas e doenças.

Desta forma, partindo da prevenção e do ataque às causas geradoras de desequilíbrio metabólico em plantas e animais, os métodos agroecológicos de manejo de tais organismos se tornam bem sucedidos à medida em que encaram uma propriedade do mesmo modo que um médico deveria olhar para uma pessoa: como um "organismo", uma individualidade única e repleta de interações dinâmicas e em constante mudança.

Diferença entre o Manejo Integrado de Pragas (MIP) e os Métodos Agroecológicos

O Manejo Integrado de Pragas (conhecido como MIP), constitui um plano de medidas voltadas para diminuir o uso de agrotóxicos na produção convencional, buscando otimizar o uso desses produtos no sistema. O princípio da agricultura convencional de atacar apenas os efeitos, permanece à medida em que todas as práticas se voltam para o controle de pragas e doenças e não para o equilíbrio ecológico do sistema. Contudo, existe uma preocupação em se utilizar agrotóxicos apenas quando a população desses organismos atingir um nível de dano econômico (em que as perdas de produção gerem prejuízos econômicos significativos), diminuindo a contaminação do ambiente com tais produtos.

Já os métodos agroecológicos buscam aplicar o princípio da prevenção, fortalecendo o solo e as plantas através da promoção do equilíbrio ecológico em todo o ambiente. Seguindo essa lógica, o controle agroecológico de insetos, fungos, ácaros, bactérias e viroses é realizado com medidas preventivas tais como:

• Plantio em épocas corretas e com variedades adaptadas ao clima e ao solo da região.
• Fazer uso da adubação orgânica.
• Rotação de culturas e adubação verde.
• Cobertura morta e plantio direto.
• Plantio de variedades e espécies resistentes às pragas e doenças.
• Consorciação de culturas e manejo seletivo do mato.
• Evitar erosão do solo.
• Fazer uso de adubos minerais pouco solúveis admitidos pela Instrução Normativa.
• Uso de plantas que atuem como "quebra ventos" ou como "faixas protetoras".
• Nutrição equilibrada das plantas com macronutrientes e micronutrientes.
• Conservação dos fragmentos florestais existentes na região.

Entretanto, cabe ressaltar que algumas das estratégias usadas no Manejo Integrado de Pragas, que visa a diminuição do uso de agrotóxicos nas lavouras, podem ser adotadas pelos produtores orgânicos. Vejamos, a seguir, tais estratégias com mais detalhes:

Estratégias para o Manejo Agroecológico de Pragas e Doenças

1 - Reconhecimento das pragas-chave da cultura:


Consiste em identificar qual o organismo que causa maior dano à cultura. Por exemplo, no caso do algodão, o bicudo constitui o inseto mais importante no elenco de organismos que prejudicam a cultura. Na cultura da banana os principais organismos são fungos, responsáveis pelo "Mal de Sigatoka" e pelo "Mal do Panamá"
Conhecer a praga-chave de cada cultura ajudará o agricultor a adotar práticas que incentivem a reprodução de seus principais inimigos naturais, ou que criem condições ambientais desfavoráveis à multiplicação do organismo indesejável

2 - Reconhecimento dos inimigos naturais da cultura:

Diversos insetos, fungos e bactérias podem atuar beneficamente como agentes de controle biológico das principais pragas e doenças e, o que é melhor, de forma gratuita na medida em que ocorrem naturalmente no ambiente. Conhecer as principais espécies e favorecê-las através de diversas práticas (manejo do mato nativo, adubação orgânica, preservação de fragmentos florestais, entre outros), é uma estratégia fundamental para o sucesso do controle de pragas e doenças na agricultura agroecológica.

3 - Amostragem da população dos organismos prejudiciais:

Monitorar a presença das pragas através da contagem de ovos, largas e organismos adultos (no caso de insetos), ou da vistoria das plantas (% de dano em caso de doenças fúngicas ou bacterianas), é uma atividade obrigatória para que o produtor saiba quando agir e o faça de modo a promover o equilíbrio ecológico de todo o sistema de produção.

4 - Escolher e utilizar as táticas de controle:

Mesmo promovendo o equilíbrio do sistema, a persistência de determinadas pragas e doenças no ambiente é comum e nem sempre basta a adoção apenas de medidas preventivas. A traça do tomateiro (Tuta absoluta ), a requeima da batata (Phytophora infestans) são exemplos desse caso. Assim, quando existem ameaças destes organismos promoverem um dano econômico às culturas agroecológicas, será necessário ao agricultor adotar práticas "curativas". Tais práticas atuam como "remédios" para as plantas, como o uso das caldas bordalesa ou sulfocálcica, por exemplo.

Plantas Companheiras

São plantas pertencentes a espécies ou famílias, que se ajudam e complementam mutuamente, não apenas na ocupação do espaço e utilização de água, luz e nutrientes, mas também por meio de interações bioquímicas chamadas de Efeitos Alelopáticos. Estes podem ser tanto de natureza estimuladora quanto inibidora, não somente entre plantas, mas também em relação a insetos e outros animais.

Seguem alguns exemplos:

As plantas da família das solanáceas (tomate, batata, pimentão, entre outras) e as da família das compostas (Cichoriaceae), como alfaces e chicórias combinam bem entre si. Estas famílias, por sua vez, também combinam com umbelíferas (Apiaceae) como cenoura, salsa, aipo, erva-doce, batata-salsa e com Liliáceas como o alho e a cebola.
As cuburbitáceas (abóbora, pepino, melão, melancia, chuchu) associam-se bem com as solanáceas, com plantas leguminosas(feijão, ervilha) e gramíneas(milho, trigo), conforme seu hábito de crescimento e forma de cultivo; alternado-se fileiras -duplas tutoradas, por exemplo, de tomate, feijão-vagem e pepino, ou na tradicional associação de milho, feijão e abóbora.

A regra geral para uma boa associação ou rotação de culturas é a de escolher sempre uma sequência de plantas de famílias diferentes.


Alelopatia Aplicada

Em relação aos insetos prejudiciais, algumas plantas têm ação repelente ou atrativa. Ambos efeitos podem ser utilizados nos exemplos a seguir:

Plantas Antagônicas

Algumas espécies possuem substâncias que afastam ou inibem a ação de insetos, como ocorre, por exemplo, com o piretro, presente no cravo-de-defunto e nos crisântemos. Como qualquer estratégia de manejo agroecológico, o uso de tais plantas não deve ser feito isoladamente e, sim, dentro de uma visão abrangente de promoção do equilibro ecológico em toda a propriedade agrícola. Quanto mais equilibrados estiverem o solo, as plantas e os animais, menor será a necessidade de se apelar para tais estratégias, aproximando a produção orgânica da situação ideal que é a de pouco intervir porque agroecossistema já se tornou capaz de se auto-regular.

a) Cravo-de-defunto (Tagetes minuta) e ou Cravorana (Tagetes sp) silvestre.As plantas inteiras, principalmente no florescimento, são boas repelentes de insetos e nematóides (no solo). Usadas em bordadura das culturas ou em pulverizações na forma de extratos alcoólicos, atuam tanto por ação direta contra as pragas, quanto por "disfarce" das culturas pelo seu forte odor.
Fórmula Geral: 200 gramas de planta verde, mascerados por 12 (doze) horas em álcool (aproximadamento 1 litro) e diluídos em 18 a 19 litros de água (20 litros para pulverização)

b) Cinamomo (Melia azedorach L., família Meliaceae)O chá das folhas e o extraído acetônico-alcoólico dos frutos (ambos na dosagem média de 200 gramas para um volume final de 20 litros para pulverização) são inseticidas. Os frutos devem ser moídos e seu pó pode ser usado na conservação de grãos armazenados.
Observação: É uma árvore ornamental comum no sul do Brasil, de origem asiática.

c) Saboneteira ( Sapindus saponaria L.)Árvore nativa da América Tropical, usada como ornamental , possui nos frutos um efeito inseticida. Para se ter uma idéia de seu poder de ação, vale mencionar que seis frutos bastam para preservar 60 quilos de grãos armazenados.
Os estratos podem ser feitos dos frutos amassados diretamente em água (uso imediato) ou conservados por extração acetônica e/ou alcoólica. Em ambos os casos, 200 gramas são suficientes para o volume de 20 litros de um pulverizador costal.

d) Quássia ou Pau-amargo (Quassia amara, família Simarubaceae)Arbusto alto, nativo da América Central, com ação inseticida especialmente contra moscas e mosquitos, pelo alto teor de substâncias amargas na casca e madeira. Estas partes podem ser usadas em pó ou extrato acetônico-alcoólico, assim como os ramos e folhas, variando apenas a concentração: 200 gramas de cascas ou madeira moída.

e) Mucuna-preta (Mucuna sp ou Stizolobium oterrium)Plantada associada ao milho, evita mais de 90% da instalação dos gorgulhos nas espigas

Atrativos ou "Plantas-Armadilhas"

Muitas plantas possuem substâncias atrativas específicas para alguns insetos, que podem ser utilizadas como plantas-armadilha para várias pragas. A simples concentração dessas pragas já as torna mais vulneráveis a parasitas e predadores, assim como mais sujeitas a doenças, permitindo também a utilização de métodos agroecológicos de manejo de pragas e doenças.

Seguem alguns exemplos de plantas atrativas de comprovada utilidade na horticultura:

Purungo ou Cabaça (Lagenaria vulgaris)Plantado em bordadura (em forma de cercas-vivas) ou com seus frutos cortados e espalhados na lavoura é o melhor atrativo para o besourinho ou vaquinha verde-amarela (Diabrotica speciosa).

Tajujá (Cayaponia tayuya)Planta da família das cucurbitáceas, atrativa para as vaquinhas. Sua limitação consiste no fato de que as raízes que são a parte mais útil da planta, são de cultivo mais difícil que o do Purungo.

Adriane C. Baccaro
Engª Agrônoma
Boutin Campo e Jardim
(41) 3027-5133

Um comentário: